quinta-feira, 16 de outubro de 2008

sábado, 6 de setembro de 2008

No Blog da Cris Moreno

Hoje é aniversário de Jinkings.

Recebe homenagens da família e dos amigos.

Taí, não consigo usar o verbo no passado,

no tempo do houve, aconteceu, existiu, viveu...

sou resistente, como ele!



Beijos, Jinkings. Feliz aniversário!


Postado por Cris Moreno
Veja na íntegra aqui

Parabéns, Velho Jinkings


Fala, Velho Jinkings! Parabéns!

Era assim que eu queria dar um grande abraço no meu velho-pai-camarada. E era assim que ele ia receber muitos abraços de amigos de todas as classes, idades e níveis culturais.

A facilidade dele tratar com diferentes, respeitando e sendo respeitado por todos - mesmo o mais ferrenho opositor (inimigo, não acredito que tivesse) - talvez seja a qualidade dele que mais me marcou e que eu mais admiro, até hoje. Quantas vezes vi meus amigos da turma jovem dos movimentos estudantis, sociedade de direitos humanos, etc., criticá-lo por ser "reformista", enquanto eles queriam derrubar a ditadura com discursos inflamados (às vezes, nas mesas dos bares). E ele, sempre com calma, explicava com convicção, segurança, firmeza, mas com a paciência de um mestre, como devia ser o processo.

A tranqüilidade dele em todos os momentos, o auto-controle me enchiam de orgulho. Lembro uma vez - eu devia ter uns nove anos, acho - que eu estava brincando na rua e tive alguma briguinha com outro moleque da vizinhança e o babaca do pai dele veio me ameaçar, dizendo que "enrolava meu pai como uma bobina de rádio..". Fiquei muito puto e fui contar pro velho. Ele não disse uma palavra; calçou os sapatos (estava descansando após o almoço, acho), vestiu uma camisa e foi lá. O otário do vizinho ficou pálido, gaguejando que eu tinha entendido mal, que ele tinha dito que me enrolava, não ao meu pai... Voltei pra casa cheio de orgulho; orgulho maior do que se o velho tivesse dado umas porradas naquele babaca...

O abraço não vou poder dar. Mas posso dizer, mais uma vez:

Parabéns, Velho Jinkings!
Obrigado por ser teu filho!
Obrigado pelos teus exemplos!
Se eu conseguir passar pros meus filhos um pouco do que recebi, já vai ajudá-los a levar a vida com a simplicidade e a firmeza de caráter que eu sempre admirei em ti, pai!

Beijo do Toninho
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sexta-feira, 5 de setembro de 2008

Rock and Roll



Papai, com as atividades políticas e sindicais, vinha sempre à Brasília. Um ou dois dias, às vezes menos. Era sempre muito bom estar com ele. Carinhoso com as netinhas, brincalhão. Elas curtiam a visita. Íamos a bons restaurantes, coisa que ele nos ensinou a apreciar. Onde pudéssemos comer uma boa paella ou uma carne de caça.

Algumas vezes eu o acompanhei ao Congresso Nacional, para reuniões com as lideranças ou algum outro assunto.

Naquela época eu militava em partidos trotskistas. Ele, sempre PCB. Hoje vejo o quanto ele era paciente e tolerante com as minhas intolerâncias. Pacientemente, ele argumentava comigo sobre os assuntos nos quais tínhamos discordância.

Em uma das suas vindas a Brasília, nas movimentações pela democratização do país, ele me deu o compacto de Gonzaguinha, com a música Comportamento Geral. De arrepiar.

Papai tinha bom gosto. Ele e mamãe tinham uma coleção de discos da MPB, desde os anos 60. Além dos livros que nos presenteavam, eles nos apresentaram o melhor da música. Me veio à lembrança que um dos discos que me apaixonou, entre o Chico – tinham tudo dele -, Dorival, Gilberto Gil e Noel, foi uma banda de rock and roll. Era a lendária Bill Harley e Seus Cometas, de Rock Around the Clock. Toquei sem trégua na minha radiolinha. Preciso lembrar de perguntar à mamãe sobre como descobriram (ela e papai) o Rock and Roll.

Leila

Papai faria hoje, 5 de setembro, 81 anos.
Aqui, a música do grande Gonzaguinha, como uma pequena homenagem. Emocionante. Daniel, filho de Gonzaguinha, canta com ele em imagem. E, de quebra, um show do “Bill Harley and His Comets” . Os vídeos geralmente custam um pouco a abrir. Dá um "pause" e deixa carregar um pouco.



sexta-feira, 29 de agosto de 2008

Uma Certa Galinha Assada, por Alvaro Jinkings


Ainda não me adaptei a internet, confesso-me um analfabeto completo, um preguiçoso talvez um “tecnófobo”!

Quando eu vi o blog do meu pai Raimundo Jinkings me veio muita história, talvez 40 anos em 1 minuto e tudo muito rápido, quase instantâneo. E somem. É como se eu fosse obrigado a fugir destes pensamentos; pra não sofrer, certamente. É o nosso incrível instinto de defesa e de sobrevivência.

Vou tentar me desbloquear, e viajar alguns momentos da minha grande e educativa convivência com “Mi Viejo”. Acho que pouquíssimas vezes me lembro dele me dizer:
- Faz assim! ou
- Não faz assim !

Ele me ensinava de outra forma, ele dava exemplo toda hora. Prestando atenção nos mínimos detalhes, eu aprenderia muito pro resto da minha vida. Eu me orgulho muito de ser filho dele: A humildade, a garra, a sabedoria, o equilíbrio, a obstinação e a determinação em lutar! Ele, pelos menos favorecido, pelos excluídos, não tinha apego ao dinheiro e nem ao poder. Inteligentíssimo, um verdadeiro autodidata, presenciei discussões homéricas dele com juizes, advogados, políticos, sindicalistas, estudantes, etc. Qualquer assunto ele dominava, menos futebol! Onde eu dava um show nele.

Nas poucas vezes em que eu não lhe entendi recorri à mamãe, a pessoa que mais o conhecia. Ela o interpretava com ternura e compreensão!

Lembro que apesar das inúmeras provocações e discriminações, nunca deixei de amar e entender “Mi viejo” como o maior de todos, o mais patriota, o mais coerente ( a cada dia que passa mais o valorizo ou seja quanto mais vivo, quanto mais conheço o mundo, mais o valorizo, e mais eu tento imitá-lo).

Hoje conto pro Yago, meu caçula as histórias do Vovô Jinkings que infelizmente ele não conheceu. Mayra e Yuri conviveram com ele por quase 10 anos, não o ideal, nem o necessário, mas o possível!

Aconteceu um fato quando eu ainda era criança que sempre me vem a cabeça. É um momento de absoluta covardia, e a mamãe me pediu para eu relatar aqui: Papai acabara de passar mais ou menos 90 dias preso na 5ª Cia de Guardas e nós (eu e mamãe) fomos até lá para trazê-lo para casa, onde meus irmãos nos aguardavam. Saíamos nós três, ele no meio de mãos dadas com mamãe e apoiando a mão no meu ombro, não chegamos a caminhar 100m quando parou um jipe do exército do nosso lado e perguntou: - Sr. Raimundo Jinkings? - Sim! Papai respondeu. – Queira me acompanhar por favor ! – Temos uma ordem de prisão! Ele, inabalável! Beijou a mamãe, me sorriu e entrou no jipe. Mamãe desabou! Era a tortura psicológica, a sacanagem, a covardia! Era a ditadura na sua face mais cruel, foram mais uns 15 dias no 26º BC [1], quando finalmente nós pudemos comer a “galinha assada” pra comemorar sua liberdade. Desta vez fomos todos buscá-los num táxi grande, um aerowillis. Talvez a mamãe pensasse em trazê-lo “na marra”, caso aparecesse outro jipe.

Depois eu conto a do porco, ou melhor: o Yago vai contar a do porco, viu vó!

ÁLVARO JINKINGS

[1] 26º Batalhão de Cavalaria
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terça-feira, 12 de agosto de 2008

Raimundo Antônio Da Costa Jinkings

Livreiro do Ano 1994. Cerimônia da entrega do título, promovida pela Câmara Brasileira do Livro - CBL.

Raimundo Antônio da Costa Jinkings nasceu no que era na época um pequeno povoado, Turimirim, distrito do município de Santa Helena, banhado pelo rio Turiaçú, no Maranhão. Teve infância pobre, trabalhou desde menino, exercitou diversos ofícios enquanto aprendia, com o pai, as primeiras letras. Mal entrava na adolescência quando, na sua avidez de saber, em meio aos pertences de seu pai, descobriu o livro do filósofo alemão Schopenhauer, “As dores do mundo”. (Estranho e inexplicável: através de que meios teria ido parar Schopenhauer naquele cantinho do mundo?)

Aquela leitura foi o prenuncio de uma vida que, toda ela, seria dedicada a lutar exatamente contra as dores do mundo, contra a injustiça, pela liberdade. Sua paixão pela liberdade o conduziu ao Socialismo. E seu coração o prendeu, aos 21 anos, a uma menina de 15, uma linda história de amor que sobreviveu a todos os golpes que a vida lhes desferiu (tantos!) durante 46 anos de absoluta cumplicidade.

Os cinco filhos que esse amor gerou cresceram felizes e formaram suas famílias.

E a grande família, hoje acrescida de quinze netos e três bisnetos, guarda um troféu que é seu tesouro: a grandeza e a dignidade que herdou com o nome, JINKINGS, sua história, seu exemplo.

Sobrevivendo às prisões e à perseguição sem tréguas, quando lhe tiraram tudo, até os direitos políticos, recomeçou do nada e, com a companheira Isa e os cinco filhinhos (Nise, Leila, Antonio, Álvaro e Ivana), em 1965 plantou a primeira semente da Livraria Jinkings, e bem a seu modo, continuou semeando a cultura e a esperança, lutando serena e corajosamente contra as dores do mundo...

Naqueles terríveis momentos, Jinkings e sua mulher também receberam a força da solidariedade, sem fronteiras, de suas famílias, de seus amigos, até mesmo dos que se encontravam fisicamente distantes.

Esse bravo, esse extraordinário guerreiro que foi vencendo, uma a uma, tantas batalhas, foi abatido pela última delas.

E então, num pedacinho de terra, ele próprio se tornou SEMENTE...

Isa

(Este texto foi postado no sítio da Livraria Jinkings. A autoria é de Isa Jinkings)

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terça-feira, 15 de julho de 2008

Mi Viejo (Piero)



Mi Viejo, de Piero

Es un buen tipo mi viejo
Que anda solo y esperando
Tiene la tristeza larga
De tanto venir andando

Yo lo miro desed lejos
Pero somos tan distintos
Es que crecio con el siglo
Con tranvia y vino tinto

Viejo mi querido viejo
Ahora ya caminas lerdo
Como perdonando el viento
Yo soy tu sangre mi viejo
Soy tu silencio y tu tiempo

El tiene los ojos buenos
Y una figura pesada
La edad se le vino encima
Sin carnaval ni comparsa

Yo tengo los anos nuevos
Y el hombre los anos viejos
El dolor lo lleva dentro
Y tiene historias sin tiempo

Viejo, mi querido viejo
Ahora ya caminas lerdo
Como perdonando el viento
Yo soy tu sangre mi viejo yo
Soy tu silencio y tu tiempo

Yo soy tu sangre mi viejo yo
Soy tu silencio y tu tiempo

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Piero nasceu na Itália e foi, ainda criança, para Argentina. É bolivariano e libertário. A música acima é de 1969. Há outras tão sensíveis e belas como essa, mas "Mi Viejo" parece ter sido feita para o papai.

quinta-feira, 22 de maio de 2008

O Famigerado Comunista


 
O FAMIGERADO COMUNISTA
por Leila Jinkings


Éramos cinco, todos menores de dez anos, em 1964. Na rua onde morávamos, tinha de tudo: comunistas, fascistas, contrabandistas e sabe-se lá mais o quê. Na esquina, os filhos de um juiz xingavam quando passávamos: “Ei, filhos de comunista!”. A princípio nem sabíamos de que éramos xingados, mas logo fomos a meus pais saber o que era comunista.

 Meus pais explicaram mostrando reportagens com fotografias e entendemos que comunistas lutavam ao lado do povo, eram solidários. Era bom ser COMUNISTA.  Ficamos muito orgulhosos de sermos filhos de comunista. Papai, sempre brincalhão, sugeriu que poderíamos responder a eles dizendo que eram filhos de fascista.
 
 
À tarde saímos para a rua armados, prontos para o embate. Todas as tardes passeávamos de bicicleta ou íamos para a praça, sempre passando pelo território inimigo.


- Ei, filhos de comunista!


- Tu é que és filho de fascista! Filho de fasciiistaaaa!
 

Veio o Golpe de 1964 e papai “viajou”. Nossa rotina não mudou: escola pela manhã, trabalho escolar até 4 da tarde e depois rua, além, claro, da guerra com os reacionários (essa palavra também aprendemos com papai e mamãe).

 Havia na rua um colega nosso que brincava de bicicleta e “pega ladrão”, cujo pai era reacionário. Ele, nesse dia, chegou excitado e foi logo se dirigindo a nós. Estávamos os quatro irmãos mais velhos e dois primos de nossa idade - Huáscar e Bolívar.  Falou: “O pai de vocês, ó: (fez um quadrado com os dedos da mão, significando xadrez, cadeia) tá preso. Pegaram ele lá no Rio de Janeiro.”


Corremos para casa a perguntar a mamãe se era verdade o que havíamos escutado. Mamãe explicou que não era verdade. Aquilo eram apenas boatos que os milicos inventavam para fazer terrorismo com os familiares dos comunistas.

 Mas, no dia seguinte, o mesmo colega, apesar de ter “pegado uma carreira” dos meus primos, veio com nova história: “Olha, o pai de vocês foi assassinado, ele fugiu e levou bala lá na Cinelândia. Estava vestido de estudante.”


Fomos chorando para casa e mamãe tentou nos tranquilizar. Nas rádios e na televisão, no entanto, os repórteres davam a notícia e os mais excitados se referiam a ele como o “famigerado comunista Raimundo Jinkings”. Ela falou que ia telefonar para meu pai e que ele falaria conosco. Mais tarde ela nos avisou que papai viria nos visitar, mas em segredo, pois os milicos queriam prendê-lo porque lutava para que os pobres tivessem os mesmos direitos que nós.

 À noite, mamãe nos chamou para o quarto que ficava nos altos e dava para o quintal. Foi muito emocionante encontrar o papai, que nos aguardava. O quarto estava na penumbra, não se podia acender a luz. Talvez houvesse um abajur ou uma vela, pois podíamos enxergar muito bem o papai. E, mais importante, senti-lo. Ele nos abraçou muito, apresentou o camarada que o acompanhava e falou que estava tudo bem, mas que ele estava escondido para que os milicos não o pegassem, porque ele era amigo de Jango e dos comunistas.


Ele estava vestindo um macacão de operário, tinha os cabelos crescidos e estava barbado. Carinhosamente, nos tirou as dúvidas e fez as recomendações que qualquer pai faz, do tipo “sejam obedientes”, “ajudem sua mãe”, além das que só um pai como ele faria: falou que não precisava explicar nada para ninguém e nem deveríamos contar que ele nos visitara, para que não pressionassem a mamãe. E que o importante era que estaria sempre em contato conosco por meio da mamãe.


 Jamais esqueci esse momento. Me senti companheira e amiga do meu pai. Muito orgulhosa dele, da sua coragem e da sua generosidade.


Leila Jinkings
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