segunda-feira, 3 de dezembro de 2007

Venderim de Livros

UM VENDERIM DE LIVROS

Paulo Nunes

Ao que parece, somos uns desconfiados. Na vida assim acontece porque as pessoas perderam a fé no outro. Daí tudo tenha que ser sacramentado em cartórios, através de testemunhas. Uma pena, pois não?!
Até a felicidade alheia parece depender da desconfiança. Até acho que a palavra poderia ser escrita diferentemente. Proponho: d,ex-confiança. Mas, vejam só, o quanto é fascinante falar sobre a palavra, já até esqueci porque estou aqui diante do papel... Ah! Sim queria falar de um homem que, para mim, representou uma época, e de quem alguns desconfiavam. Traia-se de Raimundo Jinkings. Reparem o seguinte. No nome de seu Jinkings há AR, há também MUNDO, e sem muito esforço podemos transpor o jogo de palavras à vida. Seu Jinkings desejava um mundo arejado, democrático, um mundo onde existisse a Comunhão. Seu Jinkings era vermelho de ideologia (o vermelho é uma cor caliente, apaixonante!), mas o vermelho dele se assemelhava, e muito, com todas as cores do arco-íris. E você, meu amigo que me lê, deve estar pensando: este cara está fantasiando demais o seu Raimundo. E eu te respondo: qual é o problema? Na minha cabeça humana cabem tantas impressões. E já não tenho certeza se seu Jinkings,, com o decorrer dos tempos, permanecera ainda uma pessoa ou em mito se transformara... Não fosse um mito, como ele teria resistido a tantas pressões, tantas perseguições? Um homem-pessoa resistiria assim como ele resistiu?
Lembro de seu Jinkings tão e tão maltratado pelas nuvens obscuras dos idos 60/70. E invadiam sua loja, e revistavam sua casa e prendiam-no. E logo mais seu Jinkings ali, rente que nem pão quente. Ponho-me a imaginar, ação de construir imagens no ar, como não passou baixo aquela família sentindo, minuto a minuto, tantas atrocidades. Mas é mas, e isso é que importa. Seu Raimundo sedimentou uma base sólida sobre a qual os Jinkings construíram a livraria que leva o nome da família. Hoje, com certo orgulho, nós podemos dizer, quando aí por fora nos perguntam:
Na cidade de vocês tem, ao menos, uma livrada? Eu só faço rir, com o canto da boca. Sinto vontade de responder: Temos, pelo menos, três boas cadeias de lojas de livros. Estamos isolados mas nem tanto que não possamos saber o que se tem publicado pelo mundo afora. Nosso mercado livreiro poderia ser melhor, mas não me queixo, Podemos até dizer que a fase mais recente do mercado livreiro de Belém deve muito ao sonhador-vemelho-homem chamado Raimundo. Não quero desmerecer o Neiro, o Craveiro, o Dudu. Não quero deixar de citar a livraria Dom Quixote, por exemplo. Mas seu Jinkings marcou devido sua persistência e lucidez. Sabia ele que seu projeto de uma sociedade mais igualitária perpassava por uma proposta educacional que incluísse o livro como ponte para o sonho.
Lembro bem muito bem de seu Raimundo (e me recordo, oportunamente, de Drummond: “... Mundo, mundo, vasto mundo! Se me chamasse Raimundo não seria uma rima! Seria uma solução! Mundo, mundo, vasto mundo, mais vasto é o meu coração!...”) quando a gente ainda iniciante, ia humildemente propor a compra - fiado - deste ou daquele livro. Ele tentava facilitar ao máximo nossas vidas de universitários duros. Lembro que meu primeiro dicionário Aurélio foi comprado graças à benevolência de seu Jinkings. E haja prestação e haja crediário, e os juros nem assim. Depois a livraria cresceu e o mercado tornou-se mais cruel Sempre quando falam mal de livreiros e editores, peço que façam uma reflexão, pois, neste país de fernandos, quem investe em cultura deveria ser agraciado. Cansei de ouvir dizerem coisas assim: "mas ele não é socialista? Porque o livro aumenta tanto de preço?...” Quero apenas lembrar que preço de livro não é livreiro, infelizmente, quem estabelece.
A vida é mesmo assim. Mas eu insisto, meus caros, que a Jinkings é uma livraria que, a meu ver, mantém os olhos abertos, sonhando com um público livre através do livro. Quando nos aventuramos na área da literatura infanto-juvenil, há cinco anos atrás, abrindo a Fadas & Duendes, ele despojou-se e nos apoiou integralmente? A livraria Jinkings, é claro, facilitando, ao máximo nossa atuação.
Hoje, eu resgato uma dívida não só minha, mas de diversas gerações de leitores, professores, estudantes, intelectuais, que beberam nas malhas das letras do seu Jinkings. Vou mais longe e me arrisco a dizer que uma cidade como Belém, com características de abandono social explícito, foi um lugar agraciado pela presença lúcida do seu Raimundo. Tenho certeza que ele viverá sempre entre nós, dirigindo uma velha lambreta, com os cabelos alvinhos de algodão doce e uma prateleira de livros no coração.
Quem sabe, uma horas dessas, o velho Raimundo não está tentando vender um exemplar de O Capital para São Pedro?...

Belém, Pará, 31 de outubro de 1995.


Paulo Nunes é professor da Unama e da Escola Deodoro de Mendonça. É autor, entre outros, de Banho de Chuva e leitura dos vestibulares da Unama e UEPa.

terça-feira, 13 de novembro de 2007

Miséria Humana, artigo do R.A. Jinkings

MISÉRIA HUMANA
Por Raimundo Jinkings


Quando passamos pelas ruas de Belém, principal­mente a João Alfredo, deparamos com um grande número de seres humanos que, certamente, já tiveram lar, já trabalharam, já produziram e já contribuíram com a parcela de seus esforços para o progresso de nossa Pátria, do nosso Estado, e para o enriquecimento de alguns privilegiados da sorte e do regime, mas que hoje estão transformados em verdadeiros farrapos humanos, jogados nas calçadas, submetidos ao sol e à chuva, sujeitos a toda sorte de misérias, comendo aquilo que o diabo enjeita, desprezados por tudo e por todos, humilhados pela própria sociedade. Esses mesmos homens que, sem dúvida, sonharam ter na velhice uma vida tranqüila, sem privações, digna dos que traba­lham e que produzem, viram seus esforços e seus ideais vencidos pela ambição insaciável dos ricos e pelo descanso dos governos. Triste realidade!
Quanto é triste e doloroso saber que dentre esses mendigos, que estão jogados ao léu, ostentando suas chagas físicas ao lado das rebrilhantes exposições de jóias, há um jovem que esteve na última guerra, lutou e sacrificou-se pela prometida liberdade e fraternidade dos povos. Esse in­feliz idealista voltou da guerra, doente, inutilizado para o resto da vida, mas cheio de esperanças, na certeza de que havia contribuído para a conquista do mundo com que so­nhara. Ao regressar, não desejava mais do que a Paz para o mundo e o necessário para sua subsistência. Entretanto tudo lhe foi negado. Os homens, que lhe prometeram vida melhor, esqueceram-se do compromisso, e estão agora gozando as delícias das fortunas conseguidas à custa da miséria do Povo durante a guerra, desse mesmo Povo de quem foram exigidos o sangue, o trabalho e o sacrifício, pa­ra defesa da Paz e da Democracia, dessa Paz e dessa Democracia que ainda não conhecemos.
Não poderá haver Democracia e nem poderá haver Paz enquanto assistirmos a cenas dolorosas como essas, e enquanto não acabarmos com os privilégios vergonhosos dessa estranha fauna dos capitalistas. O que precisamos é de justiça, mas a justiça só é perfeita, só é justiça de verdade quando é feita igualmente para todos, sem distinção condições sociais, de raças ou de cor. São do grande Simon Bolívar estas significativas palavras: "Conservai intacta a lei das leis: a igualdade. Sem ela perecem todas as liberdades, todos os direitos". Quão verdadeiras são essas palavras que, lendo-as, acreditamos com toda a sinceridade que um dia haveremos de dar ao nosso Povo aquilo que não nos é possível dar-lhe no regime capitalista: a igualdade econômica e social. No próprio Estados Unidos, o país capitalista mais rico do mundo, existe a fome e a miséria, consoante apuração feita em 1939, dos 30 milhões de famílias norte-americanas 8 milhões morreriam de fome se o governo não as socorresse, e 11 milhões lutariam contra a miséria. Referindo-se a essa estatística, o líder nacional do Partido Socialista, o eminente Dr. João Mangabeira, com precisão: “Tudo isso demonstra que ainda no país mais rico do mundo, o regime capitalista não pode resolver o problema da fome e da miséria".
O problema da pauperização em nosso Estado do governo imediatas providências medidas concretas benefício do Povo, com o objetivo de acabar com essa si­tuação difícil e desmoralizante.
Nem a mais santa das intenções resolve em contrário.
Lembrem-se de Fauchet na convenção da grande Revolu­ção Francesa:
"Considerando que a igualdade não deve ser uma miragem enganadora que todos os cidadãos inferiores, velhos órfãos indigentes, sejam albergados, vestidos e alimenta­dos à custa dos ricos; os sinais da miséria sejam destruí­dos, a mendicidade e a ociosidade sejam proscritas; que se dê trabalho a todos os cidadãos válidos".
Que adiantou? Nada. A questão, evidentemente, não é de sonhar. Ou o governo se mexe, ou o Povo virá a fazê-lo por suas próprias mãos inevitavelmente, de modo violen­to.
Há o caminho da construção socialista, pacífica, e há o caminho que garante sucessos, como os acontecimentos do Rio Grande do Sul estão a indicar. Escolha o governo a solução enquanto ainda lhe resta um pouquinho de tempo.

Folha, 10/08/1952
(Reproduzido no livro Entre as Letras e as Baionetas, de Jocelyn Brasil, pp. 179 a 181).

domingo, 11 de novembro de 2007

Camuflagem

Kung Fu Lounge
Friday, November 19, 2004

O filho do rato
Alejandro Jodorowsky é o cara. Eu tinha uns nove anos quando meu pai me levou à livraria Jinkings e disse para eu escolher o que quisesse. Fui direto à sessão de quadrinhos.

Em plena Ditadura, o velho Jinkings contrabandeava livros de esquerda em meio a caixas de insuspeitos quadrinhos europeus publicados em Portugal. O cara tinha as manhas. Enfiava traduções em espanhol e português de livros do Marx, Engels, Trostky e Mao no meio de álbuns de gente como Moebius, Druillet, Phillipe Caza, Enki Bilal, Quino, Palomo, Plantu e outros grandes nomes das HQs do Velho Mundo.
Meu pai comprava os Marx e companhia. Eu ficava com os quadrinhos. Coisa que, aliás, fez eu desenvolver um dialeto meio esquisito com o passar do tempo de tanto ler histórias naquele português estranho. Foi numa dessas idas à livraria do Jinkings que peguei para folhear um álbum de capa amarela: O Incal Negro - Uma Aventura de John Difool. Não fazia idéia do que era um Incal, mas o livro vinha com o nome de Moebius na capa, que eu curtia das séries Tenente Blueberry e A Garagem Hermética. Foi o suficiente para levá-lo para a casa. E junto com Moebius acabei levando também Alejandro Jodorowsky. As coisas nunca mais foram as mesmas. Mesmo para uma criança habituada às maluquices da turma da Metal Hurlant Jodorowsky era um pouco demais para mim com sua visão cínica e absurda do mundo. Tudo o que fez com Moebius na série do Incal ficou na minha cabeça, da mesma forma que, anos mais tarde, ficariam Thomas Pynchon, Alan Moore, Frank Zappa e Phillip K. Dick. Revendo El Topo essa semana, deu para entender porque esse foi o filme que levou os irmãos Cohen a se meter com cinema e fez com que John Lennon e Yoko Ono inaugurassem uma sessão da meia-noite em Nova York só para exibi-lo.

Em homenagem ao cara, republico aqui uma entrevista que fiz com ele em 2000. Kung Fu Lounge

- posted by Vladimir Cunha @ 8:45 PM

quinta-feira, 8 de novembro de 2007

Lauande homenageia Jinkings

13 de Dezembro de 2006
AI-5: de sorumbática memória

Sempre que chega 13 de dezembro eu lembro do meu amigo e camarada Raimundo Jinkings. Não tem jeito, sempre lembro dele!!! Hoje é um dia que a liberdade perdeu vez nesse país quando da edição do Ato Institucional Nº 5 foi consumada pelos militares em 1968. e todo ano eu escrevo sobre AI-5 pra mostrar minha indignação contra as facetas autoritárias no mundo da política.

Sempre digo que a liberdade é o bem mais precioso que o ser humano almeja. Por isso a humanidade, ao longo dos séculos, tem lutado continuamente no sentido de garantir esse direito a todos. Um marco desses avanços ocorreu com as revoluções americana e francesa, que levantaram a bandeira dos direitos humanos e a autonomia dos três poderes: Executivo, Legislativo e Judiciário. Essa evolução se dá entre avanços e recuos por conta de períodos ditatoriais vivenciados pelas nações. Em nosso país, uma noite de trevas se abateu a partir de 13 de dezembro de 1968, quando, com a edição do Ato Institucional nº 5 (AI-5), todas as garantias do cidadão foram suprimidas. Trinta e cinco anos depois nós precisamos recordar esses acontecimentos para que nunca mais a ditadura prevaleça.

O Brasil passou por dois períodos ditatoriais no século 20: no Estado Novo (1937-1945) e no regime militar (1964-1985). Neste último período alguns fundamentos democráticos foram preservados em seu início e no final. No entanto, entre dezembro de 1968 e dezembro de 1978, época em que vigorou o AI-5, vivemos sob a lei do arbítrio. Coincidentemente, nesses dez anos, foi registrado o maior número de execuções sumárias e de desaparecimentos de políticos em toda a nossa história.

Em 1968, o mundo viveu como nunca uma efervescência política e cultural que abalou as instituições vigentes. No Brasil, isso também se materializou com protestos estudantis, greves operárias, rebeldia parlamentar contra a ditadura e um maior envolvimento da Igreja Católica nas questões sociais. A resposta dos militares foi o recrudescimento da repressão, que culminou na decretação do AI-5 pelo presidente da época, o general Costa e Silva.

Por força desse decreto, foram fechados o Congresso Nacional e as Assembléias Legislativas Estaduais; cassados mandatos de parlamentares; suspensos os direitos políticos de oposicionistas; juízes e funcionários públicos foram demitidos ou aposentados compulsoriamente e suspenso o habeas corpus. Paralelamente, nos porões do regime intensificaram-se a tortura, os assassinatos e outros desmandos. Muitos de nossos maiores pesquisadores e professores universitários tiveram de partir para o exílio. Nossos dois últimos presidentes da República foram vítimas dessas arbitrariedades.

Nesse período, a população não podia votar em presidente, governador, prefeitos das capitais e de cidades consideradas de segurança nacional. A censura à imprensa e aos espetáculos culturais impedia que qualquer fato considerado "indesejável" aos governantes fosse divulgado. Chegou-se ao absurdo de impedir que fosse noticiada a existência de uma epidemia de meningite em São Paulo. Nem mesmo os religiosos foram poupados. Padres e freiras foram presos e torturados. Alguns deles, estrangeiros, acabaram deportados. Estudantes eram expulsos das faculdades sob qualquer acusação.

Até hoje as chagas desse período tenebroso afetam as próprias vítimas ou seus familiares. Felizmente, graças à mobilização popular, principalmente na campanha Diretas Já, a plena democracia voltou a brilhar em nosso país a partir de 1985 e se consolidou em 1988 com a promulgação de uma nova Constituição, que garante em seu artigo 5º "a inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à propriedade".

Como amigo do Jinkings e militante comunista, luto com milhares democratas constantemente para garantir o respeito às opiniões contrárias e fortalecimento da democracia, o melhor regime entre todos. Que atitudes de prepotência e práticas ditatoriais fiquem apenas nos livros de história e nunca mais se repitam em nossa terra.

E muitas saudades do meu amigo e camarada Jinkings!!!
Aquele abraço,
Lauande.

Blog do Lauande
Perfil do Lauande segundo ele mesmo:
41, casado, sociólogo, professor, comunista, produtor rural e bicolor.
Faleceu em 28 de julho de 2007.

quarta-feira, 7 de novembro de 2007

Jinkings por Isa

Raimundo Antônio da Costa Jinkings nasceu, em 05 de setembro de 1927, no que era na época um pequeno povoado, Curumim distrito do município de Santa Helena, banhado pelo rio Turiaçu, no Maranhão. Teve infância pobre, trabalhou desde menino, aprendeu diversos ofícios enquanto aprendia, com o pai, as primeiras letras. Mal entrava na adolescência quando, na sua avidez de saber, em meio aos pertences de seu pai, descobriu e leu o livro do filósofo alemão Schopenhauer, “As dores do mundo”. Estranho e inexplicável: através de que meios teria ido parar Schopenhauer naquele cantinho do mundo?.

Aquela leitura foi o prenúncio de um vida que, toda ela, seria dedicada a lutar exatamente contra as dores do mundo, contra a injustiça, pela liberdade. Sua paixão pela liberdade o conduziu ao Socialismo. E seu coração o prendeu, aos 21 anos, a uma menina de 15, uma linda história de amor que sobreviveu a todos os golpes que a vida lhes desferiu (tantos!) durante 46 anos de absoluta cumplicidade.

Os cinco filhos que esse amor gerou cresceram, felizes, e formaram suas famílias. E a grande família , hoje acrescida de quatorze netos e um bisneto, guarda um troféu que é seu tesouro; a grandeza e a dignidade que herdou com o nome, JINKINGS, sua história, seu exemplo.

Sobrevivendo às prisões e à perseguição sem tréguas, quando lhe tiraram tudo, até os direitos políticos, recomeçou do nada e, com a companheira Isa e os cinco filhinhos Nise, Leila, Toninho, Álvaro e Ivana, em 1965 plantou a primeira semente da Livraria Jinkings, e bem a seu modo continuou semeando a cultura e a esperança, lutando serena e corajosamente contra as dores do mundo... naqueles terríveis momentos, Jinkings e sua mulher também receberam a força da solidariedade, sem fronteiras, de suas duas famílias, de seus amigos, até mesmo dos que se encontravam fisicamente distantes.

Esse bravo, esse extraordinário guerreiro que foi vencendo, uma a uma, tantas batalhas, foi cruelmente abatido pela última delas.

E então, num pedacinho de terra, ele próprio se tornou SEMENTE...


Esse texto foi postado por Isa Jinkings no sítio da Livraria Jinkings.

domingo, 4 de novembro de 2007

Velhos Camaradas

Jinkings um exemplo de paraense
por Pedro Ayres

Há gente que permanece viva, pela memória e pelo simples fato de que durante toda vida construiu a verdadeira imortalidade. A da obra realizada, a do afeto, a do companheirismo, pelo profundo amor às coisas da nossa terra e do país. Tudo isto e mais um pouco definem a vida de Raimundo Antonio da Costa Jinkings, amigo e companheiro de velhas batalhas.
Conheci o Jinkings no Partidão, em que ambos militávamos. Ele, voltado para a organização sindical e trabalhadora. Eu, junto com Chico Costa, seu irmão Raimundo, Nelito e outros tentávamos dar forma e conteúdo ao Partido no movimento universitário. Desse modo, como tínhamos a visão de unir todos os movimentos num só organismo, com vistas a um futuro mais democrático e participativo para as amplas massas do país, conseguimos construir algo que era sonhado por todos os grupos de esquerda do país, mas que nunca saía do papel, uma efetiva e real Frente Operária-Estudantil-Camponesa.
Naquele período Belém sofria com constantes falta de eletricidade. Era um problema da capital e do Estado, tanto que candeeiros e lamparinas faziam parte dos utensílios de qualquer casa. Se havia alguma diferença social entre esses úteis objetos, ela ficava adstrita aos materiais de feitura, aos desenhos e aos tamanhos. Uns lembravam a Belle Époque, outros, mais modernos, traziam a marca do ecletismo e do neoclássico. Enfim, com estilo ou sem estilo a falta de luz a todos atingia.
O Governador do Estado, Aurélio do Carmo, era um democrata convicto, tanto que a despeito das tendências atrabiliárias e de direita do corpo policial paraense, conseguia garantir que os movimentos populares tivessem seu curso. A luta nacionalista se acirrava no país todo. Nós, pressionados pela carência energética, defendíamos a solução por meio de pequenas hidrelétricas distribuídas regionalmente. Grupos do governos estadual e federal queriam termelétricas, fornecidas pela ITT, a famosa Bond and Share.
Humberto "Vovô" Lopes, Jocelyn Brasil, Serrão, Bené Monteiro e Jinkings eram a base de nosso comando partidário, sendo que ao Raimundo, por sua inconteste liderança sindical, coube a tarefa de coordenar a área operária e camponesa. Como a correlação de forças políticas era bem desfavorável às nossas teses, escolhemos fazer uma greve para pressionar. Tudo correu bem, tanto que até tivemos uma reunião pública com o Governador Aurélio do Carmo, que nos assegurou que iria estudar a nossa proposta. Uma proposta respaldada em estudos do economista Moacyr Paixão. Porém, no frigir dos ovos, com o advento da "redentora", tudo foi feito como queriam as multinacionais.
Esse ineditismo de movimento e de sucesso, pois, bem ou mal, tínhamos realizado o que desejávamos, mais tarde veio a se voltar contra todos nós. Não porque pudéssemos ou tivéssemos condições de outras grandes atividades, mas, pelo medo que causou na direita golpista do Pará e da região. Ficamos tão envolvidos com a sensação de vitória que a Campanha da Legalidade de Brizola criou que nem nos apercebemos do inimigo ao nosso lado. Um inimigo que até posava de nacionalista.
Certo dia, ínicio de 62, Belém é sacudida com a notícia de que agentes do DOPS tinham invadido o Sindicato dos Petroleiros e descoberto um formidável plano para criar núcleos guerrilheiros no Pará e na região. Como sabíamos da íntima ligação entre o serviço secreto do exército e o DOPS pensávamos que era mais uma espécie de atualização de cadastro. Uma atualização muito livre e aberta, em que gregos, troianos e até espartanos entravam na lista. Com a publicação do "dossier", um documento que nunca fez justiça ao talento ficcional de seu autor, mais voltado para terras encharcadas, descobrimos que os objetivos eram: imobilizar, atemorizar e desmobilizar a todos nós, além, é claro, de fazer média com os agentes da CIA que já andavam por lá às mancheias.
O principal alvo era o Partidão e suas lideranças mais jovens, como o Jinkings, Bené Monteiro e alguns outros. Segundo o coronel Jefferson Cardim, na época chefe do Estado-Maior da 8ª Região Militar, tudo tinha sido elaborado por um major da Segunda Secção, que trabalhava a paisano numa estatal. Processos foram abertos, entretanto, não posso dizer se houve ou não inquéritos legais, pois, nunca soube de ninguém que tenha sido ouvido. Mas, também, pouco importava, o Golpe veio logo em seguida e os nossos pesadelos se tornaram realidade.
Foi a partir de 1962, quando fui enviado para o Rio, que perdi o contato com Jinkings, só sabia dele por intermédio do Jocelyn ou do Humberto. Entretanto, na década de 1970, tornou-se o representante, correspondente e distribuidor do jornal "Crítica", do qual era comentarista de política internacional e assim, mesmo indiretamente voltamos a nos encontrar.
Este Blog embora honra e homenageie o Raimundo Antonio da Costa Jinkings, também rende homenagem a figuras como Serrão de Castro, Levy Hall de Moura, Acácio e Jocelyn Brasil. A todos a minha homenagem, o meu sincero agradecimento pelas lições e pela amizade que desfrutei.

Blog do Pedro Ayres
Sexta-feira, 2 de Novembro de 2007

quinta-feira, 1 de novembro de 2007

Blog do Alencar: uma homenagem

Um Link Para Jinkings

A partir de agora tem um novo link aí do lado direito do blog. É um link para Jinkings.Conheci Raimundo Jinkings em meados da década de setenta do século passado. Eu, um jovem bancário recém-chegado de Marabá - PA, onde havia iniciado carreira no Banco do Brasil. Ele, um ex-bancário do Banco da Amazônia, com os direitos políticos cassados pela ditadura militar, iniciava uma nova e vitoriosa carreira como livreiro enquanto soprava as brasas que haviam sobrado do velho Partidão, também destroçado pela mesma dita cuja.A livraria era pequena e funcionava no porão da sua residência, na Tamoios, em Batista Campos. Pequena mas de qualidade. Tudo o que era importante e necessário para quem buscava conhecimento era ali que encontrava. O acervo - um tanto caótico - ele dominava, título por título. Ele era um livreiro que lia os livros que vendia. Os frequentadores formavam um grupo eclético, heterogêneo mesmo. Tinha estudantes, professores, juristas, bancários, médicos, militares reformados e da ativa, de esquerda e de direita, liberais, cristãos, agnósticos, evangélicos, todos se encontravam ali. O Coronel Oliveira, o famoso Peixe Agulha, era um habitué. Octavio Mendonça era outro. Cruzava com eles e ficava observando o diálogo que travavam com aquele comunista convicto, sincero, simpático, sereno e gentil com seus clientes.
A livraria cresceu e não coube mais no porão. Os negócios iam bem e o ambiente político melhorava. A livraria tornou-se uma grande livraria, moderna, com o nome dele em concreto aparente dominando a fachada inteira. Foi a primeira livraria projetada especialmente para esse fim. Até hoje é assim. Os clientes entram passando por dentro da legra G. Digamos que esse é o ponto G da Jinkings.
Tornei-me também habitué da livraria, sempre aos sábados, quando havia uma confraternização não programada e não declarada dessa rica fauna dos clientes do Jinkings, todos irmanados pelo amor aos livros. Eu comprava livros de direito, economia, política, filosofia, história e as últimas novidades do marxismo, muitas delas vindas da União Soviética. Conversa vai, conversa vem, anistia e redemocratização convivendo com atentados, Jinkings começa a reorganizar o Partidão. A convite dele e de Mariano Klautau, entrei para o partido, filiando-me formalmente ao MDB, que logo se tornaria o PMDB.Em um certo momento, Jinkings e Carlos Sampaio decidiram editar e publicar um livrinho com textos de Mao, que ainda era Tsé e também Tung. Para isso constituiram uma editora a que deram o poético nome de Boitempo.
Os filhos e as filhas de Jinkings cresceram, deram-lhe netas, netos e, salvo engano de minha parte, bisnetos. A Boitempo é uma filha legítima de Jinkings, que graças a uma outra filha de carne e osso tornou-se uma editora bem sucedida, conhecida e reconhecida em todo o país e mesmo fora dele.
Agora, pela Internet, Leila Jinkings manda avisar que tem um blog para homenagear Raimundo Jinkings.
Obrigado, Leila.Não ficaria fora desse de jeito nenhum.
Por isso homenageio Raimundo Jinkings abraçando-o com este link aí do lado e convidando os leitores deste blog para visitá-lo.
Valeu, Leila!
Valeu, camarada Jinkings!

1 de Novembro de 2007 09:42

quarta-feira, 24 de outubro de 2007

Livro sobre Löwy é dedicado a Jinkings

A Boitempo acaba de lançar o livro As utopias de Michael Löwy: reflexões sobre um marxista insubordinado, resultado do II Seminário Margem Esquerda, realizado em 2005, que marcou os dez anos de fundação da editora e o lançamento do sexto número da revista Margem Esquerda.

Intitulado “As aventuras de Karl Marx contra o barão de Münchhausen: a obra indisciplinada de Michael Löwy”, o seminário foi dedicado à memória de Raimundo Jinkings, cujos dez anos de morte se completaram no mês seguinte ao da realização da jornada. É dele o nome da editora original (fundada em Belém, Pará, no fim dos anos 1960), Boitempo, inspirado num poema de Carlos Drummond de Andrade. Diz o texto de apresentação, assinado por Ivana Jinkings e João Alexandre Peschanski: "Sem seu apoio decisivo e generoso a editora não teria sido refundada. A ele dedicamos também este livro, As utopias de Michael Löwy, em que se refletem justamente a rebeldia e o espírito transformador tão necessários à transição".

Para ler o texto completo da Apresentação, clicar em http://www.boitempoeditorial.com.br/lowy_apresentacao

Sobre o livro: As utopias de Michael Löwy: reflexões sobre um marxista insubordinado

sexta-feira, 21 de setembro de 2007

PROFISSÃO DE FÉ

"Temos direito a uma vida decente e
próspera, porque trabalhamos e produzimos.
E, por esse direito, devemos lutar a vida inteira,
hoje como ontem, amanhã e depois.
Esse dia virá, temos certeza. Tudo dependerá
de nós, de nossa persistência, de nosso idealismo e,
sobretudo, de nossa união".

R. A. Jinkings
O Flash - 10/08/53

In Memoriam. Das muitas homenagens de Jocelyn

In Memoriam

Éramos quantos?
Queríamos dar um jeito no mundo.
Éramos do PSB, do Cléo Bernardo.
Queríamos melhores dias
para os que trabalhavam
pela grandeza do Brasil.

Queríamos que o preço do pão...
Queríamos que a passagem dos ônibus...
Queríamos que os exportadores de castanha...
Queríamos a Paz.Queríamos a Petrobrás.
Queríamos a Amazônia para nós.

E não queríamos o
acordo militar Brasil–Estados Unidos.

Forças maiores se atravessaram
em nosso caminho.

O preço do pão,
o preço da passagem de ônibus
continuaram a subir.
As descascadeiras da castanha
continuaram sendo dispensadas.
A Petrobrás periclitou.
A Petrobrás ficou.
Mas não tão segura quanto
sonhávamos

Os quantos da década de 50
já não somos tantos.
Morreu o Cléo,
morreu o Zébezerra,
morreu o Barcessat,
morreu o Acácio,
morreu o Diogo.

Poucos ficaram de pé.
Estão aí dois que sobraram,
tendo mudado de trincheira.
Do Socialismo Democrático,
fugimos para o Socialismo Científico.

Há mais de quarenta anos
que ele e eu
temos caminhado ombro a ombro,
com outros tantos utopistas,
nas lutas democráticas.
Nos fizemos comunistas
cerrando fileira
ao lado de outros companheiros.

Morreu Rui Barata,
morreu o Levy Hall de Moura,
morreu o Serrão de Castro,
morreu Humberto Lopes.

Ficamos os dois
e mais uns tantos
no cotidiano
das baionetas da reação.

Ele, firme, valente,
corajoso, impávido,
sempre ali na linha de frente.
Eu a seu lado, intermitente.
Continuamos comunistas,
fiéis a Karl Marx,
mas traídos
por alguns equivocados.

Somos PC.
Ele, Raimundo Jinkings
– afirmou Vitor Pires Franco –,
é líder das lutas democráticas
no Pará.

Foi perseguido,
humilhado,
vilipendiado,
sem jamais arredar o pé,
um instante sequer,
do caminho por onde
decidiu trilhar seus passos.

A história esquece de muitos homens dignos.
Não costuma reverenciar a todos aqueles
que dedicaram suas vidas à luta
pelo bem comum.

R. A. Jinkings viveu uma vida prenhe de dignidade.

Jocelyn Brasil
(Entre as letras e as baionetas: a trajetória de Raimundo Jinkings)

quarta-feira, 5 de setembro de 2007

Feliz Aniversário, Jinkings!


Neste cinco de setembro revolvo alguns documentos de Raimundo Jinkings com a intenção de comemorar seu aniversário de nascimento posto que mais de uma década de sua partida não apagaram as marcas de sua existência entre nós em face de sua exemplar figura de líder coerente e equilibrado diante de destacados episódios da política nacional e paraense como ente de relevo no protagonismo do movimento político de esquerda que abraçou e que lhe credenciou como pródigo pregoeiro no caminho de uma sociedade de Justiça Social e Fraternidade de cujas lutas que foram ainda mais realçadas nos anos de chumbo tanto por seus atos de firmeza e de coragem como pelas palavras que espalhava aos quatro cantos do seu amplo universo militante seja pelos livros que distribuía com preciosos saberes a instrumentar os companheiros de luta seja pelas colunas publicadas na mídia paraense em que falava com segurança e propriedade de opinião aos leitores muitas vezes tolhidos em seus direitos em face da ação do obscurantismo e ávidos de informações e orientação segura como aquelas de inspirado artigo que escrevera em 15 de março de 1985 para O Liberal comemorando o início da Nova República pelo que ela representava de avanço na inauguração de um novo patamar construído através de um pacto social que no seu dizer “se originou do maior movimento de massas de todos os tempos com o povo nas ruas exigindo mudanças e repudiando definitivamente qualquer tentativa de dar continuidade ao mais longo e brutal obscurantista período de nossa história” e que se tornou vitorioso pela luta de mais de 20 anos contra a tirania a despeito dos setores sectários da esquerda que se negavam a somar esforços na condução e construção do novo tempo a empunhar “a equivocada teoria do ‘tudo ou nada’ do nem Maluf nem Tancredo apostando no impasse” e reforçando os objetivos espúrios daqueles que tramavam criar um “clima propício para mais um golpe militar reacionário violento” que ele já antevia ser novamente articulado com a “política de dominação do imperialismo americano” para viabilizar o retorno ao obscurantismo que tantas vidas patrióticas ceifou e que poderia ganhar força como resultado daquilo que Jinkings costumava atribuir à “doença infantil do esquerdismo” de suas leituras leninistas sobre as eras revolucionárias e que ainda hoje faz parte do nosso cotidiano político em que “revolucionários” lulofóbicos reforçam posições dos eternos oposicionistas golpistas e do projeto midiático de poder numa enorme incompreensão do processo de avanço para um novo patamar político com a eleição e reeleição de Lula que guarda coincidente semelhança com a infantil resistência e com as preocupações do camarada Jinkings naquele já longínquo e tancredista ido de 1985 e em outras datas e outras letras em que sua visão e equilíbrio políticos e seu grande amor à causa do Socialismo lhe fizeram sábio e merecedor da nossa admiração e de nossa vontade de sempre lhe homenagear como lhe estamos mais que justamente homenageando neste cinco de setembro.
  (Sidnei Pires)

quarta-feira, 29 de agosto de 2007

Depoimento de Odilardo Barbosa

Caríssimos!
Parabenizo-os pela inovação, criatividade, compromisso como o saber/fazer na área fundamental para a expressão da liberdade/dignidade da pessoa humana e seu ambiente: o livro e a manifestação cultural!... Muito belo com o iniciar-se dos pequerruchos! O "velho", permitam-me o tratamento (é solene e deslumbrado) não é lição, mas semente, sim, que ressurge em cada um que, de alguma forma, sente a livraria e faz dela um eterno caminhar, prazeroso e combativo. Sua história representa, sim, "aquele que é indispensável", da cantiga heróica de Brecht. O conheci, altivo, numa das celas contígua na qual eu me encontrava com outros companheiros, principalmente os históricos, do quartel do Batalhão de Selva aqui de Macapá, nos idos negros do Médici. Eu era estudante e me iniciava no radiojornalismo da Diocese, focada na teologia da libertação. Depois conheci a Fortaleza de Macapá e o Forte do Castelo. Ali mesmo, ele transparecia o combatente lúcido e generoso. Fico grato e entusiasmado com a correspondência de vocês, mais uma vez parabéns e aguardo segurar o relacionamento. Breve falarei sobre um projeto biblioteca - BIBLIOL, que estamos montando para socializar o acervo de nossa pequena biblioteca pessoal, a partir de atividades sócio-culturais.
Muito grato.

Odilardo Lima
E-mail recebido em 02/junho/2002.

Depoimento de Ricardo Antunes

Um Nome Para o Viaduto

Concordamos plenamente com o que tem sido veiculado pela imprensa. O nome do Marighella é de repercussão nacional e por isso merecedor de muitas e justas homenagens. Do mesmo modo, é importante que também outros representantes das lutas sociais sejam lembrados pelo exemplo que deram como militantes revolucionários e por isso também merecedores de justas homenagens. Por isso apoiamos o nome de Raimundo Jinkings, que tão bem representa a luta dos revolucionarios do Pará, particularmente por sua trajetória de luta por justiça social, pela cultura do Pará, construindo um pólo de resistência cultural, de esquerda, apesar de toda a perseguição a sua livraria sofreu.

Por isso nos somamos a ideia de homenagear este combativo paraense, que ainda não recebeu o merecido reconhecimento na cidade.


Domingo, 25 de Junho de 2000
Ricardo Antunes

terça-feira, 21 de agosto de 2007

Luta pela Reforma Agrária









Foto de Isa Jinkings. Junho/87


Nesse dia, um domingo, os deputados federais que faziam parte da subcomissão de Política Agrícola e Agrária da Constituinte iriam fazer uma audiência pública em Paragominas, área de conflito, com os trabalhadores rurais para colher contribuições - e não chegaram lá porque o avião da FAB em que viajavam não conseguiu pousar, por falta de estrutura do aeroporto. As alternativas seriam Imperatriz, no Maranhão, muito longe; ou os campos de pouso dos fazendeiros, mas a audiência era com os trabalhadores. E os deputados desistiriam.

Tinha havido uma enorme mobilização. Paragominas fervilhava de gente. Para lá haviam se deslocado camponeses de varias regiões. Em cima da hora, chegou o telegrama dos deputados. Então, aproveitando a mobilização, se fez um ato público (o da foto) e em seguida uma passeata.
Raimundo Jinkings havia sido convidado, e ele e o deputado João Batista lideraram o evento.


Isa Jinkings

Cartas da Prisão

Isa, minha querida,

Somente eu posso avaliar, em todas as proporções, o teu desejo, o teu empenho e, sobretudo, a tua grande preocupação em saber as minhas primeiras notícias. Sei que muito andaste. Creio que imploraste desesperadamente. Mas o teu esforço, a tua dedicação de esposa e mãe carinhosa e a tua sempre solidariedade humana foram recompensados. Sabes onde estou. Sabes que estou vivo. E mais do que tudo isso, sabes que continuo tranqüilo, aguardando serenamente o pronunciamento da justiça do meu País. A vida é isso mesmo. A história não segue uma linha reta. Ela é feita de avanços e recuos. A minha profunda fé nos destinos da Pátria conduziu-nos a essa separação momentânea. Nunca aceitei a tese de que tudo no Brasil estava perdido. Que a época era do salve-se quem puder. Quis dar a minha contribuição. Não fiquei indiferente às grandes lutas do povo. Não poderei, portanto, por um simples incidente na vida, descrer do futuro glorioso de minha Pátria. Reexamino todas as minhas posições e não encontro razões ponderáveis para renegá-las. Continuo o mesmo homem, com o mesmo sentimento patriótico. Sei que outro não é o teu pensamento, pois os teus princípios cristãos, que sempre respeitei e admirei, são bem diferentes dos "daquela gente que nos olha de cima para baixo, vai à missa ou se ajoelha nos templos, veste a opa nas procissões ou beija as mãos dos Ministros do Senhor, brilha nas devoções ou priva com o clero. Pessoas que enchem de fel a vida do próximo, acusam de iniqüidades os pequenos, e espremem até o sangue o coração dos seus semelhantes,” Esse tipo de cristãos que Ruy Barbosa brilhantemente retratou é o que, infelizmente, ainda atua no Brasil de forma cínica e descarada. Os jornais diariamente refletem o caráter desse tipo de gente.
Pois bem, querida Isa, sem que algum dia ou minuto sequer eu tenha fugido de minhas responsabilidades junto a nossa família, sou obrigado a reconhecer que hoje tens dupla responsabilidade. Junto aos nossos queridinhos filhos respondes por mim e por ti. Sei bem que estás moral e intelectualmente à altura de assumi-la, quanto a isso não tenho a menor dúvida, não me preocupo. Temo, porém, que devido ao esforço despendido, a fadiga a que estás sendo levada, venhas a adoecer. Aí, então seria um desastre. Nessas condições, podes dedicar todos os dias da semana exclusivamente aos nossos filhinhos, deixando para mim apenas um. Contento-me com isso, meu bem, em benefício de tua saúde e do conforto das crianças. Semanalmente preciso apenas de um pijama, algumas cuecas e uma toalha, de vez que passo os dias inteiros de pijama. Não há condições para viver de outra forma. Quanto a jornais do Rio, dou preferência ao Correio da Manhã, cuja posição está maravilhosa. Na sua falta, a Última Hora.
Já li todo o livro que mandaste. Escolheste o livro apropriado para a época, o melhor e mais importante. Verifico agora a falta que estão fazendo um Ruy e um Mangabeira*. O Ruy foi um monstro na luta pelas liberdades contra a opressão dos potentados. Acertaste, portanto, em cheio, dando uma inequívoca prova de tua inteligência.
Amanhã cedo, quando acordares, lembra que a minha falta em casa é involuntária. Mas desde hoje recebe os beijos que tanto mereces como mãe e esposa, pela data. Simbolizas o que de mais puro existe entre as mães. Abraça por mim também a dona Laura e a Helena. Todos, enfim.
Beijos e muitos abraços do teu marido saudoso
Antônio.

O Dia das Mães foi tão emocionante, ainda mais porque logo cedo os meus lindos filhinhos vieram me entregar um vaso lindo, comprado com o dinheiro que o seu papai, (que extrema delicadeza!) tinha dado à Nise pra comprar o presente do dia das mães, isso no dia 29 de abril, quando saía pra se apresentar e assinar o ponto no Basa, sabendo que de lá iria para a prisão...
Isa

(*) João Mangabeira foi Presidente Nacional do PSB.

domingo, 19 de agosto de 2007

NÃO MORRERÁS

Não morrerás em mim. Não morrerás
assim como uma sombra na distância
o vento no horizonte e, nas manhãs,
a alegria mais pura que inventamos.
Serás presente em tudo e viverás
o segredo de todos os momentos.
Todas as coisas gritarão teu nome
e o silêncio mais puro, o mais sutil,
aquele que mais dói e acende as noites
e o ser profundamente intranquiliza
-este restituirá o movimento,
a eternidade viva de teus passos
e a certeza mais limpa de que nunca
tu morrerás em mim.
NÃO MORRERÁS.
(Sonetos do azul sem tempo)
1964/1978.
poesia de Gilberto Mendonça Teles

Edgar Augusto no Entre Letras

Conheci Raimundo Jinkings quando seu PCB já estava legalizado.
Antes, porém, já o sabia um pouco diferente dos outros.
Afinal, ainda criança, e detentor das mais distorcidas informações possíveis, tinha-o como o estranho homem que assumia, condenado pela sociedade burguesa e conservadora, ser comunista.

Olhando suas fotos pelas paredes toda vez que era preso por reuniões clandestinas do Partidão, ficava pensando:

"ele não tem cara de quem come criancinhas".

Um comunista, para mim, há tempos passados, representava tudo aquilo que perturbaria a paz da sociedade, que a viraria de cabeça para baixo, na idéia de repartir todos os bens que cada indivíduo conseguisse para si com trabalho honesto.

Mas Jinkings não tinha um semblante de malvado ...

E era um antigo colega de meu pai no Banco Amazônia. Colega de meu pai não podia representar tanta coisa negativa, pensava.

Mas naquela época, quem comprava livros com ele poderia se comprometer. Estaria sob suspeita de adesão à sua ideologia.

Uma coisa realmente complicada ..

O tempo, contudo, desfez minhas impressões. Cresci, cultivei boas amizades e, pouco, principalmente pelos idos de 69 e 70. já lia sobre o Marxismo.

A fantasia do homem estranho, diferente dos outros, acabou se rasgando com pano velho.

Afinal, o Jinkings pensava há muitos e muitos anos exatamente como eu passaria a pensar daquela época para frente.

O Rui Barata ajudou prá burro nisso. Vesti a camisa do Partidão, gravei seu primeiro programa de TV, depois da legalização. E votei no Roberto Freire para presidente.

Nas reuniões que tínhamos, lá estava ele, ex-estranho homem, já de cabeça branca, sério, sisudo, de poucas palavras, mas de cumprimentos carinhosos. Nunca nos sentamos juntos para prosear.

Não precisava acontecer isto para manter minha admiração por ele.
O Jinkings, para mim, é uma figura importante, pela firmeza, pela verdade, pela coerência. E, sobretudo, pela coragem que mostrou nos momentos mais difíceis pelos quais sua crença passou.

Uma crença que no Pará manteve o PC vivo, a despeito das duvidosas propostas de modernidade política do PPS (um filho indesejado) e que o conduziram a uma espécie de verdadeiro guardião dos verdadeiros alicerces da doutrina socialista.

Hoje, repetindo a história, ele deve ter voltado a ser, para muita gente,
aquele homem estranho ­aquele que está na contramão dos acontecimentos.

Mas isso é típico de quem nasceu para ser, o tempo todo, questionado.
E Jinkings acaba se misturando com a história política do Pará.


Edgar Augusto Proença

Belém, 1994
Prefácio do Livro
Entre Letras e Baionetas – A trajetória de Raimundo Jinkings,
de Jocelyn Brasil

Os mitológicos Jinkings

O negócio é o seguinte: a primeira vez que ouvi falar da saga dos Jinkings durante a Ditadura foi em 66 ou 67, entre sete e oito anos. Soube entreouvindo involuntariamente as conversas dos mais velhos, na sala de casa, na Alcindo Cacela. Sempre falavam dos militantes comunistas e sindicais, especialmente de pessoas como Jinkings, Pereira, Barata, Alfredo Oliveira etc. que de vez em quando estavam presos. Rotina daqueles tempos. Foi a primeira vez que escutei a palavra "greve" e logo associada a "Jinkings". Junto com "bancários" e os anos de 1961/62/63. Soube naquele instante que os Jinkings, para sobreviver, estavam vendendo livros e iguarias. Como mais tarde Rolland Barthes frisou, saber e sabor vêm da mesma acepção de apreciar. Por isso, intuitivamente para um menino daquela idade, a junção de livros e iguarias parecia coerente. Estou falando que sempre vi coerência nas atitudes do Velho Jinkings.

Mais tarde, meu pai falava que era melhor comprar livros com ele por várias razões: ele conhecia sempre o livro que a gente queria ou precisava. Depois, era um camarada e esse tipo de solidariedade entre irmãos de idéias, ideologia ou fé sempre é mais forte e mais sólido do que os laços familiares. Meu pai era um homem internacionalista, mas depois falo dele. Com pouca idade, eu ia da Alcindo Cacela até a pequena livraria, apertadinha e sempre abarrotada de livros. Comprei com ele livros que me abriam a cabeça. Comprei por exemplo os livros clandestinos/proibidos de Marx, Engels, da MIR, da Progresso e os que sobraram da Brasiliense sobre Marxismo. Comprei por exemplo, um da Codecri (do Pasquim), Poemas de Angola, de Agostinho Neto. Mas aí, meninas, eu já era taludinho. Eu estava militando, escondido de minha mãe, que era frouxa nessas questões de ativismo.

De vez em quando eu conseguia um tempo para conversar com R. A. Jinkings sobre política, economia, história. Com o mesmo fascínio com que eu escutava um sapateiro perto de casa falar sobre imperialismo, história antiga e moderna, filosofia e sociologia. Juro pras irmãs: aprendi com um bancário-jornalista (Jinkings) e um sapateiro a ver a história da humanidade com a visão diferente daquela que a ditadura pasteurizava nas escolas. Sempre eu vi nele, Jinkings, uma certa aura de heroísmo, de mito, de coragem. A admiração do menino de então só cresceu. Mesmo após quase oito anos do passamento dele, tenho isso como lição. Eu vi Jinkings trabalhar pelo partido, pelas mudanças, pela redemocratização, pela cultura, pela igualdade, pelo socialismo. Vi praticamente toda a Esquerda paraense - em todas as suas vertentes, acertadas ou distorcidas – dever uma certa formação e informação ou trabalho, ou abertura de idéias ou participação e ação a R.A. Jinkings. Eu o vi se decepcionar com os que buscaram outros caminhos. Eu o vi ser traído. Eu o vi ser acusado de coisas estúpidas como a de ser o dono do PCB no Pará. Logo ele... Logo ele que, se algum mal fez, foi contra ele mesmo, auto-sacrificando-se por um sonho. Vi pessoas com ressentimento e inveja referirem-se a ele com o objetivo de detratá-lo. A péssima inveja. Mas também vi muitas pessoas se referirem a ele com respeito e justiça. Creiam, e podem contar isso a seus filhos, sobrinhos e netos, ele honrou seu tempo. Fez a história e dela participou. E impossível falar sobre esquerda e cultura, sindicalismo e socialismo no Pará sem que se mencione o nome Jinkings.

Tenho quase 44 anos. Há dez estou fora do Pará. Não faço culto à personalidade e às vezes sacaneio com meus mitos, como faço piadas sobre Che Guevara. Não me considero com débito à família Jinkings a não ser o saciamento de meu gosto por leitura e a alimentação de minha curiosidade intelectual. Neste aspecto eu lhes devo algo. Mas posso dizer com isenção que toda impressão sobre R.A. Jinkings é verdadeira, justa e salutar. Obrigado por me lerem.

Luiz Carlos Taveira (Luca)
E-mail de 29/abril/2003

RAIMUNDO LIVREIRO


RAIMUNDO LIVREIRO

Era seu nome: Raimundo.
Seu Partido, sua vida.
Sua coragem aguerrida
Marcou seu rumo no mundo.
Em seus passos na cidade,
Rubro, o suor ensinado,
Coerência e humanidade
Foice e martelo empunhados
Partilhando a liberdade.
Belém do Pará, saudosa,
Trouxe à tua casa, a Poesia
Revestindo a livraria
Com uma luz preciosa
Que tua alma talentosa
Com clareza, construiu.
Teus cabelos prateados,
glorioso camarada
Ornam a foto emoldurada
Lembrando os sons soletrados
Do coração com teu povo,
Com tuas gentes, Raimundo.
Não trago nada de novo:
Velho carinho bem fundo
E um punhado de sins
No poema sem festins.

Jinkings, Raimundo, livreiro,
Acendi o candeeiro
A teu nome, companheiro
E assino a data: janeiro
Início de calendário,
Véspera de aniversário
De Belém, como convém.
Muitos devem muito a ti
À tua luta madura
À derradeira ternura
Forjando da noite escura
A certeza que se aclara
E que o verbo escancara.

Vivos, erguemos a voz
Trazendo a garganta aberta
E a memória bem desperta
Nesta ciranda veloz
Nesta ciranda de paz
Nesta ciranda que faz
Nesta ciranda que traz
A liberdade até nós.


Aline de Mello Brandão
( Belém do Grão Pará, onze de janeiro do ano dois mil e sete, dezoito horas. Crepúsculo)

sábado, 18 de agosto de 2007

Ziraldo conta episódio

Cartunista perdido entre comunistas em Belém

Ziraldo lança seu novo trabalho na Bienal e lembra de antiga viagem à cidade das mangueiras


DC - Que lembranças você tem de Belém?


Ziraldo - Um dia eu estava jantando em Belém. E chegou o Jinkings, dono de uma livraria e ferrenho comunista: - Ziraldo o pessoal está te esperando. E eu: — Opa! Que pessoal? — Achei que era para ir para uma boate, dançar, tomar umas, essas coisas. Que nada! Era para ir para um jantar, onde só tinha comunista. Acho que a célula do partido comunista de Belém inteirinha estava presente. Uma gente maravilhosa, mas todo mundo pensava que eu era comunista. E um deles se levantou solene e disse: — Companheiro... — e eu: — Pera aí, gente! Sou só massa de manobra. [risos]. Adoro Belém.



O Liberal, 13 de maio de 2002, Caderno Cartaz
Denis Cavalcante - Especial para o Cartaz

Arrojo e Ideologia

Raimundo Jinkings: arrojo e ideologiaPor Cláudio de La Roque Leal em O Liberal de 02 de março de 1994

Com mais de 25 anos na pro­fissão de livreiro, Raimundo Jin­kings não chegou a ser surpreen­dido quando lhe foi outorgado, e é fato inédito um livreiro do Nor­te receber, o prêmio "O Livreiro Nacional do Ano", em dezembro passado. Na realidade, a livraria Jinkings é símbolo de resistência. Primeiro, porque em um país on­de os estabelecimentos comerciais não são estáveis, manter uma li­vraria é tarefa para poucos, ainda mais em se tratando do Brasil, que não tem tradição de leitura. Depois, quando o Brasil atraves­sava o período negro da ditadura militar, Jinkings sobreviveu com a livraria Monteiro Lobato, ven­dendo, inclusive, material que o governo considerava subversivo, o que gerou prisão e depoimentos na Polícia Federal, junto com seu amigo e sócio, Sandoval Barbosa.
A têmpera de Jinkings é a grande merecedora deste prêmio. A livraria começou com um simples cômodo da casa onde mora­vam, após a cassação de Jinkings e a perda do emprego no Banco da Amazônia. Antes da livraria, quando da cassação, a família foi mobilizada e começou a vender doces na feira da Batista Cam­pos. Jinkings jamais desanimou e se hoje a livraria Jinkings é uma das maiores do norte-nordeste brasileiro, é devido a essa tenaci­dade. Esta o levou a ser represen­tante das grandes editoras nacio­nais, bem como a colocar em Be­lém, obras que dificilmente che­gavam. A maioria das livrarias existentes há 20 anos, apostavam nos livros didáticos.
A livraria é reflexo da ideo­logia de vida e trabalho de Jin­kings. Existe para fomentar a venda de livros e transformar uma simples livraria em um mun­do à parte. O tempo encarregou-se de ir adequando a militância política à vida atual. Raimundo Jinkings não abre mão de suas convicções, nascidas, aliás da leitura das obras de Victor Hugo, quando o sentido da revolta foi nascendo. Jinkings acredita em uma reforma diferente, uma re­forma plena e honesta.

"Quando não se investe em livros, a cultura é atingida direta­mente pela crise. Ao contrário do que ocorria anteriormente, as noite de autógrafos são vazias se não bem divulgadas. A mídia não era tão determinante. Todo mundo sabia o que ia ocorrer". Jinkings lembra do período quando os debates realizavam-se com freqüência e as livrarias fica­vam cheias de pessoas nos lança­mentos e as conversas iam ma­drugada inteira com troca de in­formações. Ali reciclava-se as in­formações. As mordaças da dita­dura militar só faziam com que os versos, as palavras ditas em surdina, traduzissem toda a re­pressão de um período negro na história do Brasil. Àquela altura passamos fome, mas tínhamos uma luta maior, um silêncio a ser quebrado. Verdades a serem proferidas.

Hoje, ,essas verdades foram sendo esquecidas através de pac­tos e mais pactos e as opiniões di­vergem em favor de paixões ver­dadeiramente indignas. Por paixões dignas, a Jinkings busca a interiorização. "Assim como trazemos grandes nomes da nossa literatura a Belém, promovendo debate e noite de autógrafos, queremos levar nossos escritores para o interior do Estado, fomen­tando o gosto pela leitura, dando condições a pessoas que têm pou­ca oportunidade de vivenciar essa mágica fantástica que é ler e des­cobrir o mundo através da leitura"

Jinkings quer que 94 seja o ano da leitura e só vê uma saída para isso, 'fomentar e aquecer a economia brasileira, dando con­dições dos livros chegarem às prateleiras, muito mais baratos do que vêm chegando. "Precisamos de novos empregos, maior poder aquisitivo, e nova política cultural. Para melhorar o mercado do livro, para dar condições de mais leitores, precisamos me­lhorar o nível de vida do brasilei­ro". Uma novela atualmente, mostra uma personagem que bus­ca crescer através do conhecimen­to, através da leitura. Esse com­portamento, esse valor, anda meio esquecido.

Com o prêmio que lhe foi outorgado pela Associação Nacional do Livro, Raimundo Jinkings crê que o reconhecimento faz alguma diferença. Simples, não acredita em grandes mudan­ças, mas crê que isso lhe dá con­dições de vivenciar melhor essas experiências fantásticas. Uma das quais, talvez a melhor, é, ao fim de um dia de trabalho, andar na livraria, ver as pessoas compran­do e ir conversando com um, com outro, discutindo os problemas nacionais, analisando soluções, rindo de piadas. E fica a persis­tência que enfrentou a ditadura, as crises com coragem e muita força de vontade. Persistência digna de um poema de Brecht. Aquele que fala dos imprescindí­veis.